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Cisac apresenta estudo sobre impacto da IA no mercado de música

Enquanto o mercado de criadores musicais brasileiros aguarda ansioso a votação da regulamentação da Inteligência Artificial — adiado algumas vezes, o Marco Legal da I.A. deve ser votado nesta quinta, 5, no Senado Federal –, seus representantes avaliam as consequências negativas que poderão sofrer em função de análise sem critérios que pode vir a ser feita pelos parlamentares.

De acordo com estudos, o mercado global de música gerada por inteligência artificial acumulará um valor de € 40 bilhões (R$ 255 bilhões) em cinco anos, chegando a gerar € 16 bilhões (R$ 102 bilhões) em 2028 apenas. Sozinhas, as empresas desenvolvedoras de IA generativa vão ficar com € 8 bilhões (R$ 51 bilhões) nesse mesmo período, cifra equivalente ao que deixarão de pagar aos autores das músicas e outras obras protegidas que atualmente utilizam livremente, e sem autorização, para treinar seus sistemas. Com isso, estima-se que 24% das receitas do conjunto dos titulares de direitos autorais musicais estejam em risco em 2028, com uma perda acumulada estimada de € 10 bilhões (R$ 64 bilhões) até lá.

Confederação Internacional das Sociedades de Autores e Compositores (Cisac). Reprodução/Cisac

Os dados impressionantes fazem parte do detalhado ‘Estudo sobre o Impacto da IA Generativa na Música e no Audiovisual’, patrocinado pela Cisac – Confederação Internacional das Sociedades de Autores e Compositores e lançado oficialmente nesta quarta (4), Paris.

Segundo o estudo, os autores musicais e artísticos em geral enfrentarão perdas potenciais com o avanço do modelo atual de IA generativa e uso indiscriminado de obras protegidas sem pagamento através a perda direta de receitas por conta do já mencionado uso das suas obras sem autorização ou pagamento; e da ‘canibalização’ de suas fontes de receitas tradicionais, devido à substituição de conteúdos humanos por aqueles gerados por IA, que competirão com os artistas.

Ainda segundo o que foi estudado, o mercado de streaming, no qual gêneros musicais de consumo rápido dominam esmagadoramente os charts, é um dos mais sujeitos ao impacto da IA generativa. Em 2028, os autores do estudo projetam que a música gerada por robôs representará um quinto (20%) das receitas das plataformas e até 60% das receitas de alguns catálogos.

Já no caso do audiovisual, a estimativa de valor total do mercado de geração por IA (incluído cinema, TV, redes sociais e plataformas como YouTube) é de € 48 bilhões (R$ 305 bilhões) somente em 2028, com perdas para os criadores de € 12 bilhões (R$ 76 bilhões) acumuladas em cinco anos. Já as receitas para as empresas de IA que geram conteúdos de IA poderão somar € 13 bilhões (R$ 83 bilhões) nestes cinco anos acumulados até o fim de 2028.

Para os especialistas da Cisac participantes da divulgação do estudo, em vez de lutar contra o avanço da IA, como tentou fazer a indústria há pouco mais de 20 anos para parar o avanço do digital que esteve no centro da crise da pirataria, é preciso abraçar a inovação. Mas sem descuidar por nenhum momento da proteção aos direitos das pessoas.

“Não podemos nem devemos estar contra a IA. A IA pode ser e é uma ferramenta maravilhosa. Eu a uso pessoalmente, ela pode melhorar a criatividade humana. Mas o progresso nunca pode vir às custas dos direitos dos criadores, eles precisam de uma remuneração justa, e isso não é negociável. Nós, criadores, precisamos estar na mesa de negociações. Devemos nos preparar para a era da IA, e tem que ser agora”, afirmou o presidente da Cisac, o compositor sueco Björn Ulvaeus, um dos criadores do ABBA. “Os operadores de IA estão criando vasto valor econômico. Mas as receitas devem ser compartilhadas com aqueles que criam os conteúdos, que não são públicos, mas protegidos por direitos autorais. Estamos diante de uma questão existencial. A litigância não é a melhor solução, devemos chegar a acordos”, afirma Marcelo Castello Branco, presidente do Conselho de Administração da Cisac e diretor-executivo da UBC.

O brasileiro continua: “Não somos contra a IA ou qualquer tecnologia emergente. Compreendemos plenamente os avanços revolucionários que ela pode e irá proporcionar. Estamos prontos para nos adaptar e temos feito isso há quase cem anos. Mas é necessário que alguém do outro lado cumpra com suas responsabilidades e preste atenção ao valor das obras criativas já presentes no mercado. É preciso haver um campo de jogo justo. Damos as boas-vindas a este estudo porque ele nos ajudará a apresentar nosso caso aos legisladores em todo o mundo.”

De fato, como diz Castello Branco, pela primeira vez foi possível quantificar, em escala global, o tamanho da perda a que estão submetidos os criadores pelo uso de suas obras. Trabalhos anteriores, na Alemanha e na Austrália, ambos divulgados aqui no site da UBC, já haviam trazido estimativas locais ou regionais. O estudo da Cisac, porém, traz cifras maiores e mais acuradas, inclusive sobre a capacidade de geração de renda e receitas da IA generativa, o que dá uma boa dimensão da urgência de regulá-la.

De posse de dados concretos sobre a escala do problema, a Cisac pretende continuar a fazer lobby junto a governos e tomadores de decisões globalmente, para convencê-los da necessidade de incluir uma clara proteção aos direitos dos autores nas futuras leis sobre IA.

De acordo com Gadi Oron, diretor-geral da Cisac, é certo que já existem leis de copyright e direito autoral mundo afora, mas não contemplam um cenário complexo em que muitas das big techs desenvolvedoras de IA alegam que a mineração que fazem de obras protegidas para treinar seus sistemas tem propósitos “educacionais” e, portanto, não deve ser remunerada: “Aproveitando movimentações que já estão mais avançadas na Europa, queremos estimular legisladores ao redor do mundo a aprovar leis que protejam os autores. E esses números e estimativas são grandes argumentos para isso. Legisladores e fazedores de políticas públicas precisam entender o impacto da IA para o setor cultural e criativo. Eles precisam entender a necessidade urgente de proteger os criadores humanos.”

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