Com sede na França e tendo como presidente do Conselho de Administração o brasileiro Marcelo Castello Branco (também CEO da União Brasileira de Compositores/UBC), a Confederação Internacional das Sociedades de Autores e Compositores (CISAC) acaba de divulgar seu relatório anual, referente a 2022. A arrecadação mundial de direitos autorais de execução pública musical totalizou €10,83 bilhões (mais de R$ 57 bilhões) em 2022. São 28% mais que em 2021 e maior valor de todos os tempos, o que confirma a recuperação total pós-pandemia e coloca a indústria musical em sua melhor situação em muitos anos. A América Latina, com alta de 64,9%, foi a região que mais cresceu.
Também representante de outros repertórios, como audiovisual, dramático, literatura e artes visuais, a Cisac totalizou uma arrecadação de €12,1 bilhões (R$ 64 bilhões), com alta total de 26,7% em relação a 2021 — e quase 20% mais do que os valores pré-pandêmicos.
Graças ao contínuo crescimento do streaming e das assinaturas premium, as receitas vinculadas ao digital chegaram a €4,2 bilhões (R$ 22,2 bilhões), superando pela primeira vez a radiodifusão (TV e rádio).
Uma nota discordante, no entanto, lança alguma sombra sobre o futuro do digital (streaming, sobretudo) no curto e no médio prazos. Texto do analista de mercado James Duvall, da Futuresource Consulting, publicado no relatório reforçou uma tendência sobre a qual vimos falando há meses no site da UBC: a desaceleração das novas assinaturas premium. “A situação mudou radicalmente desde o crescimento explosivo (das assinaturas) registrado em 2020. As plataformas agora sofrem as consequências tanto da inflação como da recuperação pós-Covid. O estilo de vida anterior à pandemia voltou progressivamente à normalidade, e o público vai ao cinema e aos espetáculos ao vivo com maior frequência. Espera-se que o gasto mundial nestas atividades supere US$ 30 bilhões em 2023, mais do que em 2020 e 2021 juntos. Esse influirá inevitavelmente no gasto em assinatura de serviços digitais”, escreveu.
Um panorama que tende a afetar negativamente os compositores, já destinatários de uma parte muito pequena dos ganhos das plataformas, mesmo neste período de vacas gordas. Uma análise da sociedade de gestão coletiva alemã Gema, mencionada no documento da Cisac, mostra que autores musicais ficam com apenas 5% das receitas do streaming — e um cenário de contração nas assinaturas, é claro, tende a resultar em menores recebimentos totais.
Uma tendência já detectada no relatório é a espetacular retomada do segmento de shows ao vivo e música ambiente em 2022. O salto da arrecadação em apenas um ano foi de 68,2% — apesar de que a receita total dessas fontes ainda está 7,7% abaixo do nível pré-pandemia. A multiplicação de eventos ao vivo e o desejo real do público de voltar a consumir in loco suas músicas e artistas favoritos foi global, mas o relatório separou um espaço para citar especificamente o The Town, megafestival “irmão” do Rock in Rio surgido este ano em São Paulo.
Além do evento brasileiro, o país em si foi mencionado como um dos responsáveis por fazer da América Latina a região que mais cresceu em arrecadação de 2021 para 2022. No nosso país, a expansão foi de 57,6%; no México, segundo mercado da região, foi de 71,2%; e na Argentina, terceiro lugar, o salto chegou a 85,4%. Isso apesar das flutuações cambiais nos três países, que sempre acabam impactando os resultados em euros e dólares.
O Brasil, depois de ter ocupado em 2021 a 15ª posição entre os maiores mercados para a gestão coletiva musical, subiu para o 12º posto ano passado. E resultados preliminares do primeiro semestre apresentados pelo Ecad fazem prever outro ano muito bom para os autores no país. “Os números deste relatório mostram que nossa comunidade mundial de gestão coletiva está vivendo uma extraordinária onda de mudanças. É fantástico que as arrecadações tenham alcançado níveis recorde. Contudo, não podemos ignorar as crescentes desigualdades e os desequilíbrios entre as diferentes regiões, fluxos de receitas e sociedades grandes e pequenas. Devemos encarar estes problemas de frente, com a Cisac liderando o caminho. Isto significa melhorar sistemas, resolver problemas de dados, defender os direitos dos criadores e manter a solidariedade da nossa comunidade”, diz Marcelo Castello Branco.