Ao longo das últimas décadas, a popularização de alguns gêneros musicais só foi possível graças ao “feeling” de programadores e diretores do rádio FM brasileiro. Profissionais que largaram na frente, tocando pela primeira vez artistas de ritmos ainda não consagrados. Um caso clássico é o da Fluminense FM, de Niterói, que desandou a tocar fitas demo de artistas desconhecidos com nomes curiosos, como Blitz, Kid Abelha e Os Abóboras Selvagens, Plebe Rude, Paralamas e Celso Blues Boy, no início dos anos 80. O resto da história do rock nacional todos lembram.
Fenômeno parecido ocorreu nos anos 90 com as primeiras emissoras da capital paulista que se arriscaram a tocar Raça Negra, Negritude Jr. e Só Pra Contrariar. Sem deixar de mencionar o boom vivido pelo sertanejo nesta mesma época. Esquecendo um pouquinho os exemplos do eixo Rio-São Paulo, chegamos a uma importante FM de Belo Horizonte. Surgida em 1977, a BH FM também teve momentos de pioneirismo. Foi, por exemplo, a primeira FM a tocar Zezé Di Camargo & Luciano e Leandro & Leonardo na capital mineira. E, mais recentemente, a primeira a tocar astros do funk, como Anitta e Ludmilla.
Funk, não. “Novo pop”, como gosta de definir Jonas Vilandez, gerente de negócios musicais do Sistema Globo de Rádio, grupo ao qual pertence a FM. Acumulando o cargo com a gerência executiva da própria BH, ele confirma as informações acima, mas prefere enaltecer outra qualidade da emissora: “A BH teve sim importância para o sertanejo, assim como para o pagode e novos artistas do pop, mas acho que fundamentalmente nossa importância é para a popularização da boa música”, diz.
Contratado há pouco mais de três anos, Vilandez lembra que muita coisa mudou na emissora após sua chegada. Com a experiência adquirida em anos de trabalho em algumas das maiores rádios do Brasil, como Cidade FM (Rio) e redes Transamérica e Jovem Pan, ele apostou nas pesquisas para “redesenhar” a rádio. “Isso foi no começo e segue da mesma maneira até hoje. Trabalhamos sempre em cima dos resultados desses estudos. Fazemos entrevistas nas ruas, mas dedicamos o maior tempo às pesquisas pela internet, a partir de ferramentas modernas do Sistema Globo. Identificamos os gostos de nossos ouvintes, até por monitoramento nas redes sociais. Queremos saber as preferências de nosso público, para agradá-lo em cheio. Um trabalho complexo, mas essencial, para ter uma FM popular jovem, com DNA bem definido e programação bem própria”, conclui.
Como também é fundamental, na opinião de Vilandez, tocar muita música. E quanto é exatamente “muita música”, perguntamos. “40 minutos por hora. E isso em todas as horas, das dez da manhã à meia-noite. Só tocamos menos música durante o Alô BH, programa matinal líder de audiência, com informações de trânsito, notícias, bom humor e bate papo. Depois, é sucesso atrás de sucesso. Os números da Crowley mostram que tocamos cerca de 100 músicas a mais por semana do que as outras rádios”.
No entanto, a emissora se preocupa em não deixar a quantidade influenciar na qualidade. E aí voltamos aos esforços concentrados pela equipe de Vilandez nas pesquisas. “Seja por telefone, seja pessoalmente, seja pelos grupos dos ouvintes no whatsapp, que se tornou uma ferramenta fantástica para aferição do que agrada e não agrada, todas essas informações nos ajudam a pautar musicalmente a programação. Até mesmo sucessos internacionais só entram depois de muita pesquisa nas paradas do exterior. Se a música é pop e vira hit nos Estados Unidos, dificilmente não estará rapidamente em nossa grade”.
NA LIDERANÇA
E o desempenho da BH na audiência prova que estas estratégias tem dado certo. Superada nos números apenas pela jornalística Itatiaia, a BH lidera no segmento musical, com média de 126 mil ouvintes por minuto, de segunda a sexta. Outro dado para festejar é que mesmo tendo como foco o público feminino de 20 a 29 anos, a emissora também lidera a audiência em grupos com diferentes perfis. Ouvintes que tem consagrado especialmente os ídolos sertanejos e do pagode. Prova disso é que até o final de novembro, a canção mais tocada do ano na BH havia sido “1 metro e 65”, do Sorriso Maroto. Já os artistas que mais tem alcançado sucesso com diferentes singles são as duplas sertanejas Jorge & Mateus e Henrique & Juliano.
O grupo carioca foi a atração da festa de aniversário da rádio, em dezembro último. Na oportunidade, centenas de brinquedos foram arrecadados (na troca por ingressos) e enviados para Mariana, município devastado pelo acidente na barragem de uma mineradora. Outros grandes espetáculos costumam ser promovidos pela BH, casos do festival Villa Mix, Bloco Pirraça e do Carnaval de Belo Horizonte, com a tradicional Banda Mole. Vilandez conta que a extensa relação de eventos terá um reforço em 2016: “Já promovemos os principais shows populares de BH, mas agora resolvemos criar também o primeiro festival de pagode da capital mineira. A edição de estréia terá estrutura pra comportar dez mil pessoas e acontecerá no primeiro semestre”.
O novo festival mostra que a emissora sempre busca novidades para não dar espaço à concorrência. E quais seriam os concorrentes da BH? Vilandez responde: “Há ótimas rádios, como a Liberdade FM, também com audiência relevante, mas programação diferente. É concorrência de público, não na programação. Porém, eu diria que nosso maior concorrente hoje está fora do dial. E sim, na internet, no streaming, no videogame etc.”.
Essas novas opções acendem um sinal de alerta, porém não tiram o sono do profissional. “O FM sempre será forte. Temos que reconhecer que o celular, contemplando todas as mídias, os videogames modernos e os serviços de streaming diminuem o tempo das pessoas para ouvir rádio. Sem falar que o rádio perdeu a função de ‘lançador’ de sucessos. Mas mantém outra função, super importante: a de curador. Cabe ao rádio hoje identificar o que é sucesso na internet e dar sua chancela a esse hit”, expõe. Vilandez se atenta ainda a outro detalhe: “Pode até ser que o aparelho de rádio desapareça e que acabe o dial, mas as marcas das emissoras permanecerão. Assim como seu conteúdo, na internet ou em aplicativos. Conteúdo que precisa permanecer relevante, interessante, divertido. Fazendo companhia ao ouvinte e identificando sucessos e tendências”, completa.
Agora, engana-se quem acha que as novas mídias são o maior desafio do rádio. Sem papas na língua, o gerente executivo da BH FM sentencia: “O maior inimigo do dial hoje é a evangelização do FM. E digo isso com todo o respeito aos evangélicos e a qualquer religião. Vemos muitos arrendamentos para grupos religiosos sem qualquer compromisso com a qualidade. Sem preocupação com conteúdo ou boas músicas. Nosso maior inimigo é a negligência do governo em relação à regulamentação das rádios. É algo que precisa ser revisto. Temos que zelar pelo nosso produto”. Amém!