O mercado sertanejo está repleto de histórias de superação. Artistas que se reinventaram, passaram por inúmeras dificuldades, até alcançar o estrelato. Os irmãos mineiros Victor & Leo, que em 2017 completam 25 anos de carreira, fazem parte desta lista, que inclui nomes como Zezé & Luciano, Leandro & Leonardo, Gusttavo Lima e tantos outros. A neurociência, tão presente no dia-a-dia de Leo Chaves, ensina que nas tomadas de decisões é preciso, sempre, aliar o medo à coragem. O medo aumenta o auto-controle, leva à reflexão antes de se validar uma decisão. Mas o medo não pode ser exagerado, a ponto de não permitir o risco. É preciso coragem para ousar. E foi isso que a dupla fez há 15 anos, quando saiu da zona de conforto, em Belo Horizonte, onde mantinha uma carreira relativamente sólida para as modestas pretensões dos irmãos e decidiu buscar projeção, arriscando uma mudança de base – no caso, São Paulo. A atitude foi fundamental para alavancar e consolidar a trajetória de Victor & Leo, mas trouxe com ela inúmeras situações de superação.
“Tínhamos então quase 10 anos de carreira e um CD demo com cinco faixas tocando bem em Minas. Recebemos convite para gravar pela Number One, um selo pequeno do cantor Eduardo Araújo. Largamos tudo e fomos pra São Paulo com a cara e a coragem”, lembra Leo. Um ano e meio depois de se fixar na capital paulista, a dupla contabilizava zero shows. “A gravadora achava que não devíamos nos ‘queimar’, tocar em ‘qualquer lugar’. Ela fazia divulgação em rádio dentro das suas possibilidades e sonhava com crescimento orgânico. A estratégia era explodir alguma faixa e com isso tentar entrar na agenda dos grandes eventos – o que não aconteceu, infelizmente. Resultado: perdemos o mercado mineiro, não conquistamos o de São Paulo e acabamos saindo da gravadora”, continua Leo.
Era preciso coragem pra virar o jogo. E naquele momento ela nem precisava vir aliada ao medo. Afinal, os irmãos não tinham nada a perder. Victor sempre foi o mais sensível da dupla, artisticamente falando. Coube então a Leo sair a campo em busca de espaços pra dupla se apresentar. “Acabei acertando com o Bar do Mulan, em Osasco (Grande São Paulo), para tocarmos de duas a três vezes por semana. O cachê era pequeno mas dava para bancar nossos gastos com moradia e alimentação. Depois veio o Rancho do Serjão (Sergio Reis) e espaços maiores, como o Villa Country”, lembra o cantor.
Na época, ele e Victor tiveram a ideia de fazer um cadastro dos frequentadores dos shows, como forma de criar interação com o público. Foi assim que conseguiram colocar 800 pessoas no então badalado espaço Avenida (na Vila Madalena) para a gravação do segundo disco, Vida boa, deflagrando ali a história de sucesso que estava por vir. “A repercussão foi ótima. Logo fechamos uma parceria com o Joca Ribeiro, então diretor da Nativa FM e profissional com ótimos contatos em rádios de vários estados, em especial no Triângulo Mineiro. Pouco tempo depois, fomos convidados pelo Luis Antonio Pedreira, diretor da Paranaíba FM, para tocar no Coliseu de Uberlândia. A gente achou graça. Quando morávamos em BH, tocamos algumas vezes no Triângulo Mineiro, mas sempre para públicos reduzidos. Acontece que o disco estava realmente estourado na cidade e facilmente lotamos a casa – mais de 1500 pessoas cantaram conosco todas as faixas, algo indescritível”, relembra Leo. Em 2007, a dupla gravou o álbum Ao vivo em Uberlândia, que saiu pela Sony Music, produto que definitivamente a introduziu no mercado nacional.
NA LUZ DO SOM
Neste final de ano, quando Victor & Leo completam 25 anos de estrada, chega às lojas físicas e digitais um novo álbum da dupla – Na luz do som, pela Som Livre, empresa com a qual o duo tem vínculo desde 2012. Aliás, desde que foram contratados pela gravadora das Organizações Globo, os irmãos vem experimentando novas sonoridades, que se somam ao misto de sertanejo e folk que marca a discografia de V&L. No último disco, Irmãos, observa-se uma aproximação com o pop e o sertanejo universitário em faixas como 10 minutos longe de você e Anjo ou fera. “Quando trocamos de gravadora, aproveitamos para remontar a banda de apoio, mudar figurinos e até nossa postura no palco. Eu, até então, era mais contido, interagia pouco com o público. Tinha um bloqueio, uma limitação que vinha da infância e achei que era o momento de vencer o medo de ser livre no palco. A mudança de performance e a inclusão de elementos atuais no nosso som contibuiu para que a carreira ganhasse um impulso maior”, afirma Leo.
Fora o show alusivo aos 25 anos, com o qual V&L viajam pelo país, os irmãos não planejaram nada em termos discográficos para lembrar a data. Por isso, Na luz do som, mesmo sem querer, acaba sendo um álbum com um toque de tributo. “Este CD seria gravado neste ano, independente do nosso tempo de carreira. Então a intenção não é comemorativa, mas serve para o ensejo”, afirma Victor, cujo estilo e DNA musicais estão bastante presentes no novo álbum. Na luz do som remete aos discos da dupla da década passada, quando o irmão mais velho assinava praticamente todas as faixas e empreendia a sonoridade que caracteriza a dupla. “Mas os arranjos trazem referências ao R&B moderno e a outros gêneros”, lembra Leo, parceiro de Victor em Valsa do vento – seu irmão assina as outras 11 faixas do epertório.
O primeiro single, Senhorita, lançado em maio, vem funcionando muito bem nas rádios, shows e redes sociais. São sete milhões de views no YouTube e 550 mil plays no Spotify. No início de novembro, começa a ser trabalhado o segundo single, o mesmo que dá título ao álbum. “É uma balada romântica, com traços sonoros atuais, mas que guarda nossa essência”, resume Leo, sobre a faixa que tem versos como “Na luz do som da sua voz/Em paz meu coração se vê/A noite vem na escuridão/De não ter você aqui”.
Ao longo da carreira, V&L registraram ao menos 30 duetos com artistas de gêneros variados – em 2016, a Som Livre chegou a colocar nas lojas um álbum reunindo 14 gravações dessas. Leo fala a respeito, neste momento comemorativo da trajetória da dupla: “todos os duetos são especiais. Existe admiração recíproca e afinidade musical com todos os artistas com os quais gravamos. Mas não posso negar que a gravação de Não precisa, com Paula Fernandes, foi muito impactante. Tocou muito nas rádios. Até hoje, as pessoas nos abordam pra falar com entusiasmo desta canção”, diz ele, citando ainda outras que considera especiais – Deus e eu no sertão (com Alcione) e Quando você some (com Zezé & Luciano).
Conforme citado um pouco acima, embora não haja um produto discográfico específico lembrando a data, a tour atual homenageia os 25 anos de Victor & Leo – inclusive no título. São pouco mais de duas horas de show, em que os irmãos mostram todos os grandes sucessos no período, muitos deles em medleys. “O bacana é que a gente resgatou faixas que o público adora mas que estavam fora do repertório dos últimos shows, como Jogo da vida, Boa sorte pra você e O granfino e o caipira. E estas músicas estão entre as que mais mexem com o público nas apresentações”, explica Leo. Entre espaços para shows, grandes festas e eventos corporativos, a dupla fechará 2017 com média de 12 shows/mês.
TRABALHO SOCIAL
Em paralelo à carreira da dupla, Leo vem desenvolvendo diversas atividades – até por isso Victor acabou se envolvendo mais com a produção do novo álbum. Leo acaba de lançar o livro No colo dos anjos, ministra palestras motivacionais e está à frente de um importante projeto social em Uberlândia – Instituto Hortense, que atende escolas públicas e rurais, treinando psicólogos e pedagogos para, juntamente com os professores, desenvolver habilidades sócio-emocionais nas crianças. “Há alguns anos, me vi com a necessidade de buscar autoconhecimento. Tinha conquistado tanta coisa, mas sentia um vazio dentro de mim, tinha muitas dúvidas. Foi quando passei a ter muito contato com o professor e escritor Augusto Cury, para entender o funcionamento da mente e das emoções”, explica Leo. O artista afirma que conseguiu trazer novas ferramentas para sua vida pessoal e profissional e agora passa suas experiências para o público em geral. “No livro, mostro como o desejo de liderança, a busca pelo poder e a fama podem corromper o ser humano, atrapalhando sua relação com o mundo e consigo mesmo”, explica.
No dia 18 de outubro, Victor & Leo – assim como fizeram em 2016 – realizaram o show Amigos do Futuro, no Center Shopping em Uberlândia, com renda revertida para o Instituto Hortense e para o Hospital do Câncer local. O show contou com as participações de Leonardo, Almir Sater e Chitãozinho & Xororó e será registrado pela Som Livre, para lançamento em CD e DVD em 2018. “Será um show temático, com cenografia bucólica, intitulado O cantor do sertão”, adianta Leo. “Vamos apresentar sucessos da dupla, como Vida boa, Deus e eu no sertão, Rios de amor e Tudo bem, entre outras, e faixas inéditas que, como estas citadas, foram composta por mim nos anos 90”, completa Victor.