Entre o final da década de 90 e início dos anos 2000, o projeto Acústico MTV se tornou um divisor de águas na trajetória de inúmeras bandas brasileiras. Titãs, Ira! e Capital Inicial são exemplos de nomes que “reencontraram” boa parte de seu público – cativado pelas releituras “desplugadas” de hits antigos – e ainda conquistaram uma nova geração de fãs. Quase no mesmo período, grupos um pouco mais novos, como Jota Quest, Skank e Planet Hemp, também ganharam projetos especiais com a grife da emissora, mas intitulados MTV Ao Vivo. O primeiro título da série foi justamente o primeiro trabalho ao vivo da banda Raimundos, lançado em outubro de 2000.
Integrantes remanescentes da formação original do quarteto, responsável por aquele DVD, Digão e Canisso provavelmente jamais imaginaram, à época, que o primeiro unplugged do grupo só seria gravado quase 17 anos depois. A lacuna é finalmente preenchida com Raimundos acústico (Som Livre), trabalho com 27 faixas e já lançado em CD, DVD e nas plataformas digitais.
Raimundos acústico foi gravado em duas noites no Teatro Positivo, em Curitiba, com três músicos de apoio – entre eles, Marcão, do Charlie Brown Jr. –, três instrumentistas de metais e quatro de cordas. No começo, Digão planejava algo mais enxuto, só com violões. Porém, antes mesmo dos ensaios, Canisso ligou para o guitarrista e deu uma sugestão mais ousada: “Mermão, vamos fazer um acústico lindo com cordas, metais, teclados e percussão!”. Digão topou na hora. E o projeto ganhou ares de superprodução, com direito a participações de Ivete Sangalo, Dinho Ouro Preto, Alexandre Carlo (Natiruts), Fred Castro (ex-baterista da banda) e banda Oriente.
O resultado técnico e artístico certamente não decepcionará fãs e críticos, mas Digão também gosta de enaltecer a carga emocional do DVD. “Foi tudo muito intenso. A começar pelo local da gravação, que sempre nos acolheu muito bem, onde temos um público fiel! Esse registro é de certa forma a consagração dessa formação (com o guitarrista Marquim e o baterista Caio Cunha), que está há 10 anos na estrada, firme e forte! Foi bom também ter velhos amigos de Brasília por perto (Alexandre, Dinho e Fred), cada um representando uma geração distinta e que somou muito para o projeto”, reflete.
NOME DE CONSENSO
A baiana Ivete Sangalo, uma das poucas “forasteiras” do DVD, deu brilho às releituras de Baculejo e do atual single A mais pedida. A participação foi um pedido da gravadora, que queria uma voz feminina forte e atual no projeto. “Eles sugeriram alguns nomes, mas nós torcemos o nariz. Até que me veio na cabeça a Ivete, que sempre me tratou com um imenso carinho e preenchia todos os requisitos da gravadora! Pá pum, ela aceitou na hora. E foi lindo!”.
O primeiro single do DVD havia sido Bonita, faixa que resume bem o potencial desse trabalho com os metais, segundo Digão. “Me impressionou na primeira vez que a ouvi. Foi fácil escolhê-la como música de trabalho”, conta. Além de clássicos como Palhas do coqueiro, Nega Jurema, Selim e Mulher de fases, o repertório também destaca faixas menos conhecidas da banda, caso de El mariachi, uma das preferidas de Digão. “Essa versão pegou na veia. Felizmente, tínhamos tantas músicas boas que não foram trabalhadas no decorrer da nossa carreira que nem foi preciso fazer algo inédito. Soaram como novas”.
Assim como foi absolutamente nova, para Digão, a experiência de dividir o palco com o próprio filho, Rick Campos, que toca piano em I saw you saying (That you say that you saw)”, no momento mais emocionante do DVD. “Nunca forcei a barra para que o Rick fosse músico, mas ele escolheu por si só e me surpreendeu, virando pianista clássico! Quando ele entrou no palco, até segurei a onda para sair tudo certinho. Depois, quando ele me abraçou e saiu, me dei conta do que tinha acontecido, sentei e chorei as lágrimas mais felizes da minha vida”, entrega o roqueiro.
Em tempo: o êxito do DVD tem ajudado bastante no incremento da agenda de shows da banda, que entre julho e agosto estará em cidades como Imperatriz (MA), São Paulo, Curitiba, São Carlos (SP) e Goiânia.