Um trabalho pioneiro em muitos sentidos. Com seu novo DVD, “50/50”, Gusttavo Lima conseguiu inovar sem ao menos sair do estado que é considerado uma marca registrada da música sertaneja. Foram três dias de gravação em Caldas Novas (GO), cidade com enorme potencial turístico que, a despeito da proximidade de Goiânia – cerca de 170 km –, nunca havia sido utilizada para um projeto desse porte.
Ponto para o artista que, ao escolher a maior estância hidrotermal do mundo, garantiu um cenário natural belíssimo para seu novo projeto. Aliás, ele mesmo fez questão de dar a última palavra em relação à locação. Mais do que isso, mostrou que tem a história de Caldas Novas na ponta da língua. “Eu queria um lugar mais perto da natureza, mas não era somente chegar e gravar. Foi um desafio muito grande chegar nesse local. A gente idealizou tudo. Para se ter uma ideia, o palco foi montado no local exato onde a cidade nasceu. Tudo tem um porquê. Quando Caldas Novas ainda nem existia, um grupo de pessoas se instalou do lado dessa lagoa (local próximo do palco). Um cachorro que estava com eles entrou na água para se refrescar e acabou se queimando. Foi aí que descobriram que as águas daqui são quentes”, explicou na ocasião o cantor, com ares de professor.
Ao todo, foram três dias de gravação durante a Semana Santa. O primeiro deles aconteceu na quinta-feira (24 de março), sem público. Nos dois dias seguintes, a plateia esteve presente. O show de sexta-feira ainda foi marcado por um pequeno acidente, que não tirou em nada o brilho da noite. Por conta do terreno instável, uma parte do piso de madeira onde deveria ficar parte do público cedeu. Ninguém se feriu, felizmente. Mas o fato chamou a atenção do artista, que preferiu repetir a música que interpretava no momento do incidente. A terceira noite acabou com uma grande festa comandada por Gusttavo. Após o término da gravação, ele permaneceu no palco mais de uma hora, cantando e tocando sucessos ao violão.
A religiosidade de Gusttavo Lima acabou fazendo com que o show de sexta-feira atrasasse e só começasse na madrugada de sábado. O cantor tomou essa decisão para não ter que tocar em plena Sexta-Feira Santa. “Minha família é muito religiosa. Lá em casa, ninguém come carne na Quaresma e tudo mais. Eu não queria nem marcar gravação para a Sexta-Feira Santa, mas não teve jeito. Aí, eu bati os joelhos no chão e pedi perdão a Deus”, confidenciou o cantor antes do último show de gravação.
A MÚSICA
Quando as luzes se acenderam e a música começou, ficou claro que estávamos diante de um dos maiores projetos sertanejos do ano. A integração entre o palco e a natureza formou um lindo cenário natural e ao mesmo tempo tecnológico. A direção de vídeo é assinada por Raoni Carneiro, responsável também pelos DVDs recém-gravados por Paula Fernandes e pelas duplas Bruno & Marrone e Chitãozinho & Xororó. O clima de balada tomou conta da multidão, principalmente depois das apresentações, quando DJs assumiram o som. A ideia por trás do título do DVD, “50/50”, remete à trajetória do próprio Gusttavo. Ao longo de sua carreira, ele vem mesclando momentos de romantismo com outros nos quais as músicas mais animadas dominam seu repertório. Foi uma dessas músicas com pegada baladeira que o tornou conhecido em várias partes do mundo. Estamos falando de “Balada Boa”, aquela do “Tcherere tche tche”. Entre 2011 e 2012, o hit ocupou posições de destaque em países como Alemanha, França, Bélgica, Itália e Holanda.
Apesar da tentativa do cantor de dosar o set list entre canções lentas e dançantes, percebeu-se na gravação uma leve inclinação para o romantismo. De qualquer forma, a faixa de maior destaque nos shows foi justamente uma que mistura letra romântica com uma batida boa para dançar. “Que Pena Que Acabou” é um daqueles casos de hit instantâneo. Ao final das gravações, passou-se a ouvir pessoas repetindo seu refrão por todos os cantos de Caldas Novas. O refrão grudento “Que pena que acabou, uô, uô, uô, uô / E o meu coração chorou, uô, uô, uô, uô…” ficou na memória de todos os convidados. A música logo acabou escolhida como primeiro single. “Que Pena Que Acabou” chegou às rádios em 6 de abril e teve seu vídeo divulgado cinco dias depois. Em duas semanas no ar, foram mais de oito milhões de visualizações no YouTube. Hoje, já são mais 19 milhões.
A produção musical de “50/50” ficou a cargo de Dudu Borges. Aliás, esse foi o primeiro DVD no qual artista e produtor trabalharam juntos. “Ele é um cara muito tranquilo, que entendeu o que eu queria. Pedi um repertório bacana, simples, que refletisse o que eu sou no dia a dia. Então, a gente tentou voltar naquele DVD “Inventor dos Amores” (2010). Aquele foi um projeto composto praticamente por músicas autorais, com arranjos mais simples. Se você prestar atenção na produção desse novo trabalho, vai ver que é algo bem mais natural, sem tanta ‘quebradeira’ em arranjo. É baixo, bateria, sanfona e voz”, explica Gusttavo. “Deixei para o Dudu a tarefa de filtrar as canções enviadas por compositores. Na sequência, ele me encaminhava e eu dava minha opinião”, relembra.
Se a simplicidade dos arranjos se aproxima do DVD “Inventor dos Amores”, a quantidade de músicas autorais se afasta bastante. Em “50/50”, Gusttavo é coautor de apenas quatro das 22 faixas. A explicação para a diminuição no ritmo de composições está na correria do dia a dia. “Antes, quando tinha mais tempo, chegava a compor até três músicas num só dia. Hoje, eu não tenho mais esse tempo, porque é muito show, muita correria. Então, assino apenas quatro – que eu recebi e completei o refrão ou escrevi o começo e mandei para algum amigo terminar”. Ao todo, o artista levou quatro meses para conceber o novo DVD, que deverá chegar ao mercado já em junho. “A gente está com uma preocupação muito grande em não demorar para lançar. Às vezes, você leva quatro ou cinco meses para colocar o produto no mercado e isso acaba esfriando as coisas. Então, antes do show, já tínhamos definido todo o cronograma com a gravadora (Som Livre)”.
Ao falar sobre a correria do dia a dia, Gusttavo Lima lembra que atualmente é o único responsável pelo gerenciamento de sua carreira. Essa é a realidade do artista desde o fim de 2014, quando se desligou da Audiomix, com a qual mantinha vínculo. Portanto, “50/50” é o primeiro projeto fonográfico de sua fase cantor/ empresário – o trabalho anterior, “Buteco do Gusttavo Lima”, foi gravado quando ele ainda estava no cast do escritório e lançado depois do encerramento do contrato.
Por tudo isso, o sertanejo precisava demonstrar que a qualidade não iria cair nessa nova fase. “Sempre que a gente vai gravar um DVD a tensão aumenta, pois tem muitas coisas em jogo. Ainda mais agora em que tenho que ficar com um olho no peixe e outro no gato. Enquanto estou cantando, presto atenção se está tudo bem com o pessoal da banda, se a iluminação está ok etc.”, explica. “A maior preocupação é que tudo dê certo”, completa. Para garantir que tudo corresse conforme o esperado, foi necessário um investimento de cerca de R$ 4 milhões – incluindo a estrutura do show e logística com os convidados.
O FUTURO
Engana-se quem pensa que a carreira internacional de Gusttavo Lima se encerrou com o estrondoso êxito de “Balada Boa”. Entre os planos do artista está o lançamento de um disco em espanhol. “Eu já tinha a intenção de lançar um trabalho para o mercado estrangeiro. Como surgiu o DVD, dei uma aquietada nesse projeto. Mas depois que trabalharmos o ‘50/50’, vamos retomá-lo. Será um disco totalmente em espanhol, para o público lá de fora”, adianta. Apesar de já ter se inserido no mercado externo, Gusttavo Lima lembra que nunca fez um trabalho com esse objetivo. “Tudo até agora ocorreu de forma natural. Entre as maiores conquistas da minha carreira, está a de ver pessoas que não falam português, nem imaginam o possa ser o gênero sertanejo, cantando minhas músicas”.